sexta-feira, 28 de outubro de 2011

27 de outubro

Olha, até parece que eu comi canela de cachorro: tenho andado muiiiiiiiito!!!!!
Mas muito mesmo!
Tipo indo a pé todo dia até no Terreiro do Paço ou escolhendo alguns outros lugares para ir caminhando devagarinho e olhando pros lados.
Ontem encontrei o primeiro homem que me chamou a atenção (ou seja, me "falou à perereca") aqui em Lisboa. Como eu o encontrei no consultório do NOSSO psiquiatra, acabei por concluir que efetivamente eu tenho o dedo podre para homem, deixei isto para lá (ele bem que estava falando as coisas em tom mais alto, para chamar minha atenção, porque viu que eu era brasileira. Falou em ir ao Brasil, em obras que, como engenheiro, construiu no Brasil. Falou que o melhor tempo de Portugal era quando roubavam o outro do Brasil e as caravelas vinham cheias de ouro pra cá)... eu quietinha, fazendo meu tricozinho (mocinha prendada).
Putz! Nada a ver, né? Melhor levar minhas camisinhas meladas por falta de uso de volta pro Brasil do que me envolver com alguém tão ou mais doido do que eu!
Mas... "trespassado" este intervalo sexualesco, desci a Liberdadede novo.
Olhando aquelas lojas de grife e pensando: como eu sou pobre, meu Deus! Tem coisa (loja) aqui que eu nem sabia que era de grife importante (lá só tem lojão chique).
E a loja da Porsche? Que a bestona pobretona aqui achava que era só carro.
Pensei assim: esta rua não é para mim... eles estão dando pérola a porco.
Quem devia estar caminhando por esta avenida era minha amiga Maria Regina... ela, sim, ia saber reconhecer cada uma daquelas lojas chiques que tem lá.
Mas não é só de loja chique que vive a avenida da Liberdade.
Ela tem, também, seus tipos característicos.
Tem um, da cabeça raspada, com a calça sempre caindo (mas não se vêem os "documentos") que fica andando pra baixo e pra cima e gritando. Eu nunca entendo o que ele tá falando... mas, pra mim, isto não é nenhuma novidade, porque tenho de estar sempre atenta para o que os portugueses falam comigo, porque geralmente não entendo.
UM PARÊNTESE AQUI NOS TIPOS... Isto me faz lembrar quando eu fazia os créditos teóricos do doutorado e as aulas eram em espanhol da Argentina. Nos primeiros dias, eu tinha de ficar de olhos fixos e ouvidos ligados no professor, porque se eu perdesse uma palavra que fosse... fodia!... eu até podia levantar e ir embora (se não tivesse chamada... mas não era chamada para todo(a)s... gostosonas louras não precisavam ser muito frequentes), porque daí por diante eu não entendia mais nada... depois da primeira semana, eu começava até a sonhar em espanhol e a coisa melhorava.
Mas aqui em Portugal não tem jeito... eu não consigo sonhar em português de Portugal e sempre estou me deparando com situações de mico por causa do vocabulário. Não lembram do "broche" (que aqui é chamado de alfinete de peito e onde broche é boquete?). Definitivamente, não falamos - brasileiros e portugueses -o mesmo idioma.
Mas deixa isto pra lá e vamos voltar pros tipos.
Antes dos tipos eu tenho de confessar uma coisa pra vocês. Eu tô conhecendo o outono pela primeira vez na minha vida.
As árvores não estão vermelhas, donde eu devo concluir que o pessoal do Frontierville me enganou, porque, lá, as árvores ficam vermelhas no outono.
Mas tem folha pra cacete no chão.
E ainda tem aquela chuva tá-não-tá. Aquela que você olha da janela de casa e não tá e quando chega lá embaixo, tá... daí você volta em casa e pega a sombrinha e chega lá embaixo e não tá. Aí você anda mais dez metros e tá... e assim sucessivamente...
Aqui tá frio. Tem chovido e, curiosamente, notei que tem um porrilhão de sombrinha toda arregaçada largada pelas ruas de Lisboa. Como se fosse um cemitério de sombrinhas.
Mas - OUTRO PARÊNTESE AQUI - gente, fico boba com a persistência daquela puta velha lourinha que fica na esquina da Alameda Edgard de Castro. Faça chuva ou faça sol tá lá a puta, de manhã até de noite... impressionante! Ou o mercado tá bom demais, ou tá uma merda.
Ah! Puta que pariu! Eu divago demais. Eu tava falando era dos tipos.
Então... tem um velhinho que mora na avenida da Liberdade. Ele é meu e de Nery, minha comadre. Ele tem uma "casa" arrumadinha nos degraus da escada de um prédio que parece abandonado, mas não fantasmagórico. Todo dia que Nery e eu descíamos a Liberdade (quando eu conseguia fazer Maria "Angélica" Baptista Nery andar, claro!) a gente ficava observando o velhinho e reparando como ele estava ficando cada vez mais amarelo, a cada dia que passava.
Hoje eu "vi ele". Eu já tava pensando nele, por causa do frio. Pensando no que ele estaria passando com aquele frio que tava fazendo... aquela chuva doida... de repente, dei de cara com o velhinho... o mesmo amarelão de sempre... meio que sentado, meio que de cócoras... ao redor dele, um monte de pombos... e ele dividindo a comida dele com os pombos.
Cara, aquilo me deu um aperto no peito. Caralho! Eu não sabia se me tocava mais fundo a impressão de solidão de ter de se cercar de pombos para ter a sensação de que não se estava absolutamente só neste mundo... nem sabia se me doía mais o peito em ver aquele cara que não tem porra nenhuma nesta vida, a não ser aquele pacotinho que ele guarda no "armário" das escadas do prédio abandonado, dividindo o nada que ele tinha com quem tinha menos ainda.
Fiquei pensando: seria solidariedade inata? seria carência?
O caralho! Eu não quero saber o que era aquilo. Não quero ser racional. Só quero admirar aquele homem que, provavelmente nunca reparou que eu passo por ali de vez em quando, me dar as mais profundas e emocionantes lições de generosidade e de desprendimento que já recebi na minha vida.
Não chorei na rua, porque fiquei com vergonha, mas choro agora. Tenho muito que aprender com ele e jamais o esquecerei.

3 comentários:

  1. Eu quero guardar o seu texto por muito tempo,muito bom de se ler !!!

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  2. PQP, cuma,
    Vc retratou tão bem o velhinho que eu até o revi, dando milho aos pombos!E chorei com vc.bjs.

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  3. Pois é... e eu me lembrei de vc quando vi ele...

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